De 1984 a 2014 Trinta Anos
de Brasília
Marco Antônio Santos De
Amorim
Em 1984 quando cheguei, Brasília era uma cidade
espaçosa e ampla, facilmente identificável tanto a olho nu quanto por percepção
intuitiva. Esses vazios eram palpáveis tanto no deslocamento enquanto pedestre
quanto em automóveis. A população do Distrito Federal era de pouco mais de um
milhão habitantes.
O Distrito Federal conta hoje com 2.570.160
habitantes (IBGE – Censo 2010), quase triplicado em trinta anos. Haverá um
crescimento de trezentos por cento entre 1984 a 2014 (previsão projetada).
A ocupação urbana cresceu e adensou-se, porém a
infraestrutura urbana, pouco acompanhou este crescimento. O Plano Piloto em
pouco mais de cinquenta anos, “parou no tempo” embalado pelos “defensores” preservacionistas,
e com o apoio institucionalizado e internacionalizado, da Unesco e seu plano de
“tombamento”.
Entre agir e preservar entre a politicagem e os
escândalos de corrupção, entre a “implementação” de uma infraestrutura urbana
para a capital do país, e os preparativos para a Copa do Mundo de Futebol em
2014, pouco se faz e pouco se fará.
Onde estão sendo feitas as obras essenciais que
acompanhariam tal crescimento populacional e que permitiriam a esta capital
solucionar os graves problemas de transporte público, os graves problemas de
habitação, os problemas do saneamento básico, da mobilidade urbana e das poluições sonoras e visuais?
Brasília como capital do Brasil deixa muito a
desejar. São questionamentos dentre tantos que me permito abordar neste
trabalho.
As Idéias e o Planejamento
O primeiro questionamento seria o da curiosidade em
saber como foi possível Brasília ter se permitido permanecer, imune às
mudanças, às reflexões, ao planejamento, aos estudos e aos debates? Após a sua
inauguração em 20 de abril de 1960 a cidade foi sendo povoada. As “cidades
satélites” nasceram paralelamente ao surgimento de Brasília, e ao mesmo tempo,
em uma nítida intenção, de manter preservado e imutável, o Plano Piloto.
Resultando em um total isolamento, tanto do povo que ajudou a construir esta
cidade, quanto das classes mais baixas[1].
“Para conter as invasões constantes em terras
próximas da capital, foi criada a cidade de Taguatinga, em 5 de junho de 1958,
em terras que anteriormente pertenciam à Fazenda Taguatinga. Inicialmente, a
cidade se chamava "Vila Sarah Kubitschek" mas, depois, seu nome foi
alterado para "Santa Cruz de Taguatinga", permanecendo apenas
Taguatinga. Não raro, é chamada pelos habitantes locais simplesmente de
"Taguá" (Wikipédia).
“Assim como Brasília, Sobradinho também é uma cidade
planejada. O plano da cidade foi elaborado entre 1958 e 1959 pelo engenheiro
Inácio de Lima Ferreira, que pertencia ao quadro de engenheiros do Departamento
de Terras e Agricultura da Novacap. Lúcio Costa, urbanista, principal
responsável pelo planejamento de Brasília e chefe do Departamento de
Urbanismo da Novacap preferiu que o planejamento fosse executado por um
arquiteto de sua equipe. O projeto de Sobradinho foi então confiado ao urbanista
Paulo Hungria Machado, que também já havia feito o plano urbanístico da região
administrativa do Gama. A construção da cidade se desenvolveu entre 1959 e 1960
com recursos do Departamento de Terras e Agricultura da Novacap. Pouco depois,
Inácio Lima Ferreira retomou o projeto, executando serviços topográficos,
arruamento e locação de terrenos, instalando os serviços subterrâneos de
abastecimento d'água e saneamento básico” (Wikipédia).
“O arquiteto Paulo Hungria, em maio de 1960,
desenvolveu a planta urbanística da cidade do Gama, na forma de colmeia, dividindo-a em
cinco setores: Norte, Sul, Leste, Oeste e Central. O Setor Central (para
atividades mercantis) não foi detalhado em função das necessidades futuras.
Porém, coube ao engenheiro José Maciel de Paiva, por ordem do então prefeito
Israel Pinheiro (ex-presidente da Novacap), instalar um núcleo pioneiro e
promover as primeiras transferências, iniciadas a partir de setembro de 1960.
Foi auxiliado pelo engenheiro José Carlos Godoy, pelo fiscal Agnelo Dias Correia
(que juntamente com sua mulher são considerados os moradores pioneiros da
cidade), pelo mestre-de-obras Joaquim Santana, entre outros. A então
cidade-satélite foi fundada no dia 12 de outubro de 1960. O povoamento inicial
foi efetuado com a remoção de 30 famílias residentes na Barragem do Paranoá, em
1960. Posteriormente a cidade recebeu grande parte dos moradores da Vila Amaury
e da Vila Planalto. Em 1970, foram transferidos os habitantes instalados no
Setor de Indústria de Taguatinga. Hoje, é uma cidade em rápido desenvolvimento,
com uma economia cada vez mais independente de Brasília, com destaque para a
construção civil. O Gama hoje possui cerca de 127.121 habitantes (PDAD
2010/2011)” (Wikipédia).
“Em 1965, o arquiteto Paulo Magalhães, que foi
também Administrador Regional, elabora para Planaltina um Plano Diretor que
prevê o desenvolvimento urbano da cidade, com o objetivo de garantir uma
ordenação estrutural capaz de comportar as diversas alterações que a cidade
sofreu com a transferência da Capital. A partir de 1966 Planaltina sofre
alterações periódicas com a implantação de loteamentos para receberem pessoas
que não podiam se fixar no Plano Piloto (invasões e população de baixa renda de
varias partes do país), tais como: Vila Vicentina, Setor Residencial Leste
(Vila Buritis I, II, e III), Setor Residencial Norte A (Jardim Roriz) e
ampliação do Setor Tradicional (www.planaltina.df.gov.br)”.
Para que serviria o Plano Piloto afinal? As “cidades
satélites” foram concebidas para abrigar as classes baixas e média-baixas, e o
Lago Sul para abrigar as elites. Seria o Plano Piloto destinado apenas aos
funcionários públicos, que após a aposentadoria, dariam a sua vez de uso, aos novos
servidores, de “seus atuais apartamentos funcionais” como se despissem de seus
uniformes, ou como se esvaziassem as gavetas dos escritórios, das suas
respectivas repartições públicas?
O pensamento em vigor previa um plano imutável desde
o início. Não se cogitava uma só expansão além dos limites rigidamente
delineados na forma de avião. Era o desenho urbano de Lucio Costa, era o
projeto arquitetônico de Oscar Niemeyer. Era o que deveria ser preservado, o
restante (as satélites) ficaria sob a responsabilidade enfadonha do detalhe, o
que permitiria manter, a capital do país, como uma cidade-burocrática e
intocável.
Neste aspecto entra em conflito a imagem do homem
empreendedor, cujo símbolo de “espírito progressista” nos possibilitou
Brasília, com a do homem político. Por que JK, um homem visionário, e com o
poder nas mãos, não pensou Brasília para todos? Por que Brasília não poderia
ter hoje três, quatro, cinco ou seis asas? Por que Brasília hoje não poderia
dar a mesma qualidade de vida democraticamente a todos, ou pelo menos, a uma
população de quase três milhões de habitantes do DF (Censo 2010 com a projeção
futura)?
Ilustração do autor sobre o croqui de autoria de Lúcio
Costa como parte da Memória Descritiva do Plano Piloto.
Porquê Lúcio Costa não cogitou esta possível
expansão? Em Brasília, cidade que inventei, Lúcio Costa afirma: “No caso de
Brasília tratava-se de conceber uma cidade para a capital do país no deserto,
na savana, como se fosse na Sibéria, compreende? Não tinha nada, não tinha
paisagem. A cidade não tinha que se adaptar a nenhuma ambientação local. Havia
unicamente o céu. Era o horizonte e o céu imenso. Aquele céu imenso de
Brasília, onde as nuvens têm uma presença enorme”. Se assim o era, então por
que Lúcio não imaginou ter as quatro ou seis asas como forma de expansão futura
da cidade? Por que não pensou, que afinal, tratava-se de um desenho no deserto,
onde apenas as nuvens, seriam testemunhas daquela visão? Lúcio demonstrou ser
um poeta, mas infelizmente, com pouco idealismo.
Brasília já nasceu antidemocrática, já nasceu
egoísta. Aqueles que defendem o tombamento de Brasília tem todo o direito de
fazê-lo, pois agora, já é tarde demais para não “engessa-la”, para torná-la uma relíquia imutável. As Satélites são "guetos". Não existe unidade de tecido urbano. Não existe continuidade. Trata-se de fragmentos, de "desenhos riscados na terra", sem espírito de humanidade.
Quando poderíamos torná-la utópica, optamos pelas soluções egoístas e antidemocráticas. E não adianta agora buscar o refúgio em justificativas, também antidemocráticas, de que desvios houveram por culpa do regime militar que veio logo a seguir à inauguração (o golpe militar foi em março de 1964). As cidades dormitório (ou Satélites) foram inauguradas antes deste período.
Quando poderíamos torná-la utópica, optamos pelas soluções egoístas e antidemocráticas. E não adianta agora buscar o refúgio em justificativas, também antidemocráticas, de que desvios houveram por culpa do regime militar que veio logo a seguir à inauguração (o golpe militar foi em março de 1964). As cidades dormitório (ou Satélites) foram inauguradas antes deste período.
Acontece que as contradições são inúmeras. Acontece
que a falta de um planejamento impossibilitou uma clara ausência de debates.
Era JK contra o resto do país. “Cidade amaldiçoada” (frase atribuída a Jânio
Quadros no livro 1961, Brasil entre a ditadura e a guerra civil.). O Rio de
Janeiro não desejava Brasília e o Rio de Janeiro era a nossa capital. A luta
pela construção de Brasília foi titânica, uma luta do homem sábio, contra uma
classe desprovida de sentimento humanitário.
Nas mesmas proporções de uma luta ferrenha a favor da
construção de Brasília, logo após, veio a luta pela efetivação e implantação
das mudanças administrativas, da antiga Capital, para Brasília, e
posteriormente, a luta pela defesa de Brasília e pela sua preservação, que é
travada até hoje. Acredito que devido a essas lutas, criou-se um arsenal de
proteção em torno desse “objeto do desejo”, eliminado qualquer tentativa de
explorar, uma janela de discussões e reflexões que seja, que levassem a tornar Brasília,
em um verdadeiro sonho, que poderia ser jamais imaginado em lugar nenhum em
todo esse planeta.
Brasília poderia ser o que jamais será. Brasília
teria uma chance, mas hoje encontramos descontentamentos e críticas. Por mais
que tentemos defendê-la, esse sonho não se tornou realidade, pelo menos, para
os moradores das Satélites. Hoje creio, que o melhor destino para o Plano
Piloto, seja realmente tombá-lo.
A Arquitetura de Brasília
Lúcio Costa (arquiteto) sempre transpareceu de uma sensibilidade
admirável. A Asa Sul (e apenas ela) espelha o Parque Guinle
(Edifícios do Parque Guinle RJ 1943 – 1954), reflete Monlevade (Vila Operária
Monlevade MG 1934). Qual maravilha interpretativa e qual fantástica analogia
com a verdadeira essência dos valores estéticos dos desbravadores bandeirantes.
A arquitetura de Lúcio Costa, pré-Brasília, possui
um valor inestimável para a cultura do Brasil. O senhor Costa com toda a
certeza bebeu das ideias revolucionárias e patrióticas de Wright. Traduzindo
para o português brasileiro os nobres princípios de base que fizeram a
revolução “Wrightiana”. Com sabor de café passado na hora, com sabor de “pão de
queijo”, a expressão vernacular, contida em sua arquitetura, dos anos 30, 40 e
50, são deliciosas.
Esta simplicidade maravilhosa, infelizmente hoje, só
pode ser saboreada por poucos, se poucos podemos considerar, de uns 250.000
habitantes (apenas a Asa Sul)! A Asa Norte não rebate o charme da Sul. Lúcio se
cansou rápido, desde o início. “Lucio Costa, em uma entrevista publicada na
“Folha de S. Paulo”de 22 de julho de 1995 (suplemento “Mais” págs. 4 a 8)
declarou: “Não estava interessado em Brasília. Fui procurado por muitos
arquitetos que queriam minha colaboração e sempre recusei. Eram seis meses de
prazo e os arquitetos achavam o período curto. Nesse intervalo fui aos Estados
Unidos, convidado pela Parsons School of Design. Não estava interessado no
concurso. Quando voltei por mar, comecei a me interessar por Brasília. Cheguei
faltavam menos de dois meses para terminar o prazo e me ocorreu uma solução que
me pareceu válida. Desenvolvi a ideia e apresentei na última hora, no último
dia. Já estavam fechando o guichê. Fiquei no carro e minhas filhas foram
entregar o projeto”. [2]
Seriam o cansaço ou o desânimo que levariam Lúcio
Costa a uma total letargia ou a falta da paixão por seu Plano Piloto? Paixões
estas que sobravam em sua arquitetura. Seria para Lúcio o rótulo de urbanista,
demasiadamente pesado e enfadonho, comparados à leveza e a simplicidade,
expostas em suas "casas coloniais"? Ou teria sido o pensamento
grandioso dos norte-americanos que contagiou Lucio Costa? Durante a sua estadia
na Parsons School of Design, teria Lucio, ampliado a sua visão para além do
simples objeto? Teria Lucio compreendido, de que o urbanismo, seria tão
importante quanto a sua própria arquitetura, só então, decidindo participar do
concurso? São questionamentos, talvez, que nunca obteremos respostas.
Este amor que faltou desde o início, transferiu a
Brasília um destino, de nascer e crescer, como um filho abandonado. O momento
para cuidar do filho querido era aquele, mas Lúcio Costa, a pesar de estar
literalmente inspirado da vitória, previa, talvez, o enorme aborrecimento, que
aquela decisão poderia lhe causar. “Compareço, não como técnico devidamente
aparelhado, pois nem sequer disponho de escritório, mas como simples maquis do
urbanismo, que não pretende prosseguir no desenvolvimento da ideia apresentada
senão eventualmente, na qualidade de mero consultor. E se procedo assim
candidamente é porque me amparo num raciocínio igualmente simplório: se a
sugestão é válida, estes dados, conquanto sumários na sua aparência, já serão
suficientes, pois revelarão que, apesar da espontaneidade original, ela foi,
depois, intensamente pensada e resolvida; se o não é, a exclusão se fará mais
facilmente, e não terei perdido o meu tempo nem tomado o tempo de ninguém”.[3]
Brasília assim, sem amor e proteção, não poderia
almejar um grande futuro. Lúcio como “mero consultor” deixou Brasília sem um
“projeto executivo”, deixou seu Plano Piloto sem um detalhe que seja. Um
simples esboço à mercê dos políticos, dos críticos, dos aventureiros, dos
engenheiros, dos desenhistas, dos técnicos, dos invasores de terras e sem a
proteção paternal do arquiteto.
Brasília hoje poderia ser um exemplo de sucesso
urbano. A verdadeira cidade igualitária, socialista, e por que não dizer,
comunista. Uma Brasília igual para todos, igual para a grande maioria. A Asa
Sul seria igual a Asa Norte e assim por diante (no caso de haverem outras
Asas). A Asa Norte teria a mesma configuração dada a Asa Sul. A mesma simplicidade
coerente dada aos Comércios Locais Sul haveriam nos da Asa Norte (hoje
opostamente distintos). A Asa Norte teria sido privilegiada com aquela
arquitetura moderna, limpa e despojada.
Mas sem o seu o pai, sem o seu protetor, Brasília
foi perdendo amor e acabou por se tornar esta “colcha de retalhos” de desenhos
urbanos, sem identidade, sem “pai nem mãe”. O tombamento de Brasília deve se
limitar à Asa Sul. Esta sim, tem o DNA de Lúcio Costa. A Asa Sul em todo
Distrito Federal, é o único “retalho” desta multifracionada colcha, que merece
a paternidade do arquiteto, o único desenho verdadeiramente “Luciocostiano”.
Brasília é insípida e “desmotivante”. Muitos
verdadeiramente não amam Brasília, apenas precisam dela, devido ao apoio
paternalista, que o Estado amplamente possibilitou, a estes poucos
privilegiados. Somos todos escravos desta ampla inércia do enriquecimento
aventureiro em que esta capital nos condicionou. São os condomínios irregulares
ou as invasões das terras públicas, já que o preço para morar no Plano, é
assustador. Somos como os bandeirantes em busca das esmeraldas.
Enquanto este processo aventureiro vem ocorrendo,
nos corações de cada brasiliense, a TERRACAP vem se encarregando de tornar a
Nova Capital, cada vez mais inacessível, contribuindo para que o preço do metro
quadrado construído em Brasília, seja bem mais valorizado do que em Miami.
Também não poderia ser diferente, afinal, não resta muito para ser expandido.
Apesar de Brasília não ter alcançado seus objetivos
políticos, em relação ao plano social, alcanço-o no plano estratégico. “No
Brasil Colônia, quando se falava em interiorização da capital, as considerações
de segurança sobrepunham-se a todas as demais. Não era segura uma cidade à
beira mar. Salvador fora atacada muitas vezes, conquistada e saqueada. O Rio
pagara também o tributo em vidas e fazendas. Praticamente todas as vilas e
cidades litorâneas haviam sido invadidas e saqueadas: São Vicente, Vitória,
Olinda, Recife, Salvador, Rio de Janeiro. A própria metrópole portuguesa, Lisboa,
curvara-se à ameaça que Haya lhe fizera de enviar uma esquadra a subir o Tejo e
concordara em pagar à Companhia Privilegiada das Índias Ocidentais, como
indenização pela perda de Pernambuco, seis milhões de cruzados, além de
devolver as peças de artilharia que conquistara e de conceder favores especiais
no comércio de açúcar”.[4]
Brasília finalmente não se tornou a “Capital da
Esperança” (assim batizada pelo ministro da cultura da França Andre Malroux).
Mas se tornou a capital de um país atípico que é o Brasil. Este país continuará
a sua trajetória atropelando a si próprio, e mesmo sem rumo, esperaremos que
alcance a sua maturidade democrática.
É muito fácil a crítica sobre o produto acabado. Ao
mesmo tempo, é difícil criticar este mesmo produto acabado, sabendo-se que as
críticas não servirão a um objetivo concreto. Interpreto as críticas neste
trabalho como utópicas assim como a própria utopia que gerou Brasília. Fica
muito fácil entender todo o processo gerador da nova capital, a partir da
complexidade cultural do nosso povo.
Mas a crítica se faz necessária, exatamente, para que erros primários em desenho urbano, e não em urbanismo, sejam repetidos por falta de críticas.
A maior lição de "como não fazer" igual ao que foi feito neste Plano Piloto: uma cidade é organismo vivo. Uma cidade cresce e evolui. o Plano não evolui, não pode crescer e é estático. Isso contraria qualquer espírito de cidade. Toda cidade cresce e essa foi a lição que Lúcio nunca aprendeu em todos os seus anos de formação, graduação e prática profissional, que uma cidade deve ter a solução de continuidade e ser previsto a sua expansão, e que esta expansão, seja garantida com as mesmas soluções de qualidade da proposta, para todos.
O Plano Piloto em forma de avião não replica o critério básico do tabuleiro xadrez, da continuidade, a exemplo de NY City, Barcelona ou Pompéia. Fechado em si mesmo, como uma "ilha da fantasia", exclui a conexão com as Satélites, com a possibilidade de dar a todos, ricos e pobres, a mesma qualidade proposta nas suas Superquadras. Nega ao "gueto" o direito a Cidade Jardim. Termo que tanto utilizou para defender o novo, o inovador, o pioneiro.
Ao contrário do que todos, que defendem Brasília cegamente, o Plano Piloto não é democrático e já nasceu elite ao excluir do pobre o direito de habitar na "cidade jardim".
As Superquadras 400 foram concebidas para os funcionários subalternos, serviçais (motoristas) dos escalões mais elevados da república que habitariam nas 200, 100 e 300. O operário, o faxineiro, a cozinheira, a lavadeira, o micro, pequeno e médio empresários, seriam alijados do processo urbano e a esses restariam as Satélites. Cidades essas sem o mesmo carinho e afeto de Lúcio Costa.
Hoje o Plano está "cheio". Apenas poucos privilegiados podem usufruí-lo. Se Lúcio tivesse aprendido a lição, não existiriam os guetos, as satélites, mas apenas Superquadras e "todos teriam o mesmo tecido urbano de vida".
Mas a crítica se faz necessária, exatamente, para que erros primários em desenho urbano, e não em urbanismo, sejam repetidos por falta de críticas.
A maior lição de "como não fazer" igual ao que foi feito neste Plano Piloto: uma cidade é organismo vivo. Uma cidade cresce e evolui. o Plano não evolui, não pode crescer e é estático. Isso contraria qualquer espírito de cidade. Toda cidade cresce e essa foi a lição que Lúcio nunca aprendeu em todos os seus anos de formação, graduação e prática profissional, que uma cidade deve ter a solução de continuidade e ser previsto a sua expansão, e que esta expansão, seja garantida com as mesmas soluções de qualidade da proposta, para todos.
O Plano Piloto em forma de avião não replica o critério básico do tabuleiro xadrez, da continuidade, a exemplo de NY City, Barcelona ou Pompéia. Fechado em si mesmo, como uma "ilha da fantasia", exclui a conexão com as Satélites, com a possibilidade de dar a todos, ricos e pobres, a mesma qualidade proposta nas suas Superquadras. Nega ao "gueto" o direito a Cidade Jardim. Termo que tanto utilizou para defender o novo, o inovador, o pioneiro.
Ao contrário do que todos, que defendem Brasília cegamente, o Plano Piloto não é democrático e já nasceu elite ao excluir do pobre o direito de habitar na "cidade jardim".
As Superquadras 400 foram concebidas para os funcionários subalternos, serviçais (motoristas) dos escalões mais elevados da república que habitariam nas 200, 100 e 300. O operário, o faxineiro, a cozinheira, a lavadeira, o micro, pequeno e médio empresários, seriam alijados do processo urbano e a esses restariam as Satélites. Cidades essas sem o mesmo carinho e afeto de Lúcio Costa.
Hoje o Plano está "cheio". Apenas poucos privilegiados podem usufruí-lo. Se Lúcio tivesse aprendido a lição, não existiriam os guetos, as satélites, mas apenas Superquadras e "todos teriam o mesmo tecido urbano de vida".
O Sistema Viário
Se no pensamento do planejamento de 1960 o Plano
Piloto seria destinado apenas a quinhentos mil habitantes e esta população é
que viveria e trabalharia no Plano Piloto, fatalmente a população das
satélites, caso trabalhassem para o Plano Piloto, teriam que se deslocar no
início e no fim de cada dia pelas mesmas vias de acesso. Um efeito sanfona que
vemos até hoje, e ainda por cima, agravado com o aumento da população. Hoje
estamos com mais de dois milhões de habitantes residindo em cidades satélites.
Restringindo-me apenas aos assentamentos ditos
“planejados” (Taguatinga, Sobradinho, Gama, Guará, etc.), as distorções se
intensificaram a partir dos anos 70 com o surgimento dos “condomínios” surgidos
nos anos 80 e 90. A partir desses acontecimentos, a capital do país ficou sem
rumo e com a liberdade total pela desorganização urbana.
Hoje dentro do quadrilátero do Distrito Federal de
5.787,784 km², com apenas um Município, com uma população de 2.570.160
habitantes, resultando em uma densidade demográfica de 444,07hab/km² (Censo
Demográfico 2010 – fonte IBGE), é alarmante o quanto se intensificou e
adensou-se o trânsito viário da Capital do país.
Dentro desse quadrilátero presenciamos a “colcha de
retalhos” de desenhos urbanos distintos ligados por artérias ao centro
geométrico que é o Plano Piloto. Essas artérias de ligação estão se entupindo a
ponto de causar um verdadeiro infarto agudo do miocárdio (IAM), erroneamente
chamado de ataque cardíaco – Wikipédia. As artérias do Distrito Federal não são
permeáveis. Uma vez entupida, o fluxo viário não dispõe de ramificações
opcionais, de percursos secundários ou terciários. No Plano Piloto para se
deslocar de um ponto A ao ponto B, em muitos casos, só dispondo de uma ou no
máximo, de duas opções de percurso. Além de uma estrutura viária atípica e mal
projetada para o Distrito Federal.
A malha viária do Distrito Federal não encontra
similaridades em outras cidades do planeta. Esta exclusividade custa-nos
dispendiosas somas de dinheiro (tanto dinheiro público quanto privado) e tempo
para utilizá-la e mantê-la. Diante destas especificidades, resta-nos não o
conflito, mas a interpretação. Não chegaremos a lugar algum se não enfrentarmos
as dificuldades, buscando não apenas soluções prototípicas fáceis, mas também,
e por que não, soluções autóctones, ditas próprias de uma “cidade sem
esquinas”.
O altíssimo custo do transporte público no Distrito
Federal envolve a benevolência do financiamento paternalista, da esfera
governamental, para com os empresários das companhias de transportes urbanos de
Brasília. Mesmo nos EUA, onde é notório a fama de uma assistência
médica-hospitalar totalmente privada e cara, mas ao menos por lá, a educação
básica é pública e gratuita, o transporte é de responsabilidade do governo e a
segurança também, e são todos, bem sucedidos. O transporte público nos EUA é
função do Estado (Public Authority), e assim como por lá, deveria ser em
Brasília. No Brasil, o povo paga caro por um transporte público e privado, sofre
com a falta de segurança, não possui um ensino fundamental de qualidade, e
sofre nas filas de espera dos hospitais que são públicos, porém mal geridos.
A distância percorrida entre o plano piloto e
qualquer uma das cidades satélites é preenchida por vazios urbanos. Isolar o
Plano Piloto das Cidades Satélites é o mesmo que separar, ou isolar, uma classe
de outra. Poderíamos interpretar este isolamento como se as Cidades Satélites
fossem como guetos. Esta estrutura radial e com o termo “satélite” (ou Cidade Dormitório),
explicita claramente heliocentrismo. Estrutura radial e concêntrica, como aros
de uma roda de bicicleta, e sem os vínculos que possibilitariam, as
inter-relações, entre os aros, o que levaria a quebra da rigidez deste único
percurso possível, entre cada Cidade Satélite e o Plano Piloto
Soluções para a irrigação e aumento da
permeabilidade viária de Brasília são óbvias, mas são decisões, que pelo visto,
só serão efetivadas após o amadurecimento político da nação. Enquanto o governo
estiver refém das decisões político-partidárias, todo planejamento estará
subjugado a uma plataforma também política e partidária. Não haverá espaço para
um órgão público de planejamento, com autonomia e independência. Um bloqueio de
pista (um trem bate em uma carreta que vira no meio de uma pista, acidente
ocorrido no dia 26 de outubro de 2012 na Cidade do Automóvel) pode causar o
entupimento de uma artéria por horas ou até por um dia todo. Para muitos,
encontrar outra via de evacuação, pode se tornar um exercício complicado.
No Plano Piloto não se pode conduzir um automóvel,
utilizando-se apenas a via W1, à partir da 102 Norte até a 116 Norte ou da 102
Sul até a 116 Sul. O condutor é obrigado a fazer um desvio e tomar as vias W3
Sul ou Norte e as vias ERW S ou ERW N (Eixo Rodoviário West – Sul ou Norte). O
fluxo de veículos é fortemente canalizado de uma via para a outra,
sobrecarregando a mesma. Fazendo a analogia com os vasos sanguíneos, esta
sobrecarga levaria fatalmente à morte do paciente, pois representaria o bloqueio
de uma artéria. A via W1 nada mais é do que uma artéria bloqueada, uma rua sem
saída, um “cul de sac” (termo francês para rua sem saída).
Assim como as vias W1 não permitem um livre trânsito
dos automóveis a não ser por desvios para a W3 ou para a ERW, o mesmo ocorre,
para os pedestres que diariamente utilizam os diversos obstáculos de
acessibilidade que se encontram no Setor Comercial Sul e Norte. Verdadeiros
labirintos desafiadores para qualquer tentativa de atender a NBR 9050[5]. Soluções existem, e fatalmente ocorrerão, mas não
sem antes uma grande briga de foice entre os preservacionistas e os demais.
Brasília sofre com a falta de permeabilidade
rodoviária. Esta mesma falta de permeabilidade é sentida principalmente pelo
pedestre. Os vazios são como barreiras invisíveis.
Aqui novamente é bom lembrar sobre a crítica
construtiva. A crítica visando um único objetivo, o de promover a reflexão
positiva deixando a decisão, não para uma ou duas pessoas, mas para todo um
povo, ou pelo menos, para os que habitam (os usuários desta capital). Vale
ressaltar de que o enfoque da discussão não se limita ao Plano Piloto, mas ao
Distrito Federal.
Conclusão
Brasília agora se prepara para um grande evento em
2014, o de sediar parte da Copa do Mundo no Brasil. Não está se preparando de
maneira correta. O governo decidiu abrir mão da construção do sistema de
veículo leve sobre trilhos o VLT, por julgar que já é tarde para deixá-lo
pronto até 2014. Embora não fique pronto para servir aos turistas que virão
para a Copa, mas poderia atender aos moradores do Distrito Federal em 2016 ou
2020! Então por que não iniciar já?
A W3 com suas lojinhas “singelas” (“A gradação
social poderá ser dosada facilmente, atribuindo-se maior valor a determinadas
quadras como, por exemplo, às quadras singelas...” – Memória descritiva do
Plano-Piloto de 1957), estão totalmente descaracterizadas em uma verdadeira
batalha pelo visual bem aterrador. A poluição visual tomou conta, além de o
governo não se importar, se as fachadas estão ou não apodrecendo, ou se as
marquises estão prontas a despencar. Sem mencionar as calçadas de pedras
portuguesas “mais parecendo uma boca banguela” (Caetano Veloso – é chique agora
citar os poetas músicos).
Desde de que decidi retornar à UnB, como aluno
especial, tinha em mente, fazer esta crítica construtiva à Brasília.
Durante os dez anos que estive morando fora do
Brasil entre a França e os Estados Unidos da América do Norte, pude amadurecer
meus pontos de vistas tanto profissionais, como de usuário das cidades. Não
viso neste trabalho, que considero utópico, alguma intenção conclusiva e
fechada sobre todos os aspectos abordados. Creio sim de poder possuir um
elemento gerador de idéias, e que poderão, ser exploradas no futuro.
O importante é não considerar o embrião formador,
como um ato falho ou sem conteúdo. Nunca será, ao meu ver, um feto natimorto. O
meu objetivo é o de refazer a crítica, e a inverter, para um plano construtivo.
Espero que aqui estejam contidas intenções de verdadeira vontade de contribuir,
e não apenas o de manchar a imagem, daqueles que ajudaram a erguer a Capital do
Brasil. Se por um descuido, ou até por vontade própria, ocorreu o contrário,
foi por pura intenção de dizer que “basta” aos erros, nós brasileiros podemos
fazer melhor.
Não sei dizer se, apenas no Brasil, ou se em outros
países também, se utilizam o termo “maquiavélico” para nos referir a algo
realizado intencionalmente com o espírito maléfico ou vingativo. Acontece que
Maquiavel era uma espécie de diplomata na Itália renascentista, e não era, nem
nunca foi, maquiavélico. Este é o objetivo deste trabalho, o de ser crítico
sim, mas não irônico, falso, egocêntrico ou negativo, ou o de permitir, que a
palavra “crítica”, seja utilizada apenas negativamente.
Bibliografia
Tamanini,
L. Fernando: Brasília Memória da Construção - Documentário, primeiro e segundo
volumes, segunda edição, Projecto Editorial, Brasília, 2003.
Internet
(World Wide Web).
Markun,
Paulo e Hamilton, Duda: 1961 – Brasil entre a ditadura e a guerra civil.
Bemvirá Editora, São Paulo, 2011.
Wisnik,
Guilherme: Lucio Costa – São Paulo: Cosac Naify, 2001.
[1]
Durante as obras de construção de Brasília, os operários com família moravam na
Cidade Livre e os solteiros ou desacompanhados moravam nos acampamentos das
Construtoras. Mas sabiam que tão logo se inaugurasse a nova Capital
desapareceriam os acampamentos e a própria Cidade Livre. Para onde iram então?
Certo é que não dispunham de recursos para adquirir casa ou apartamento na
cidade que estavam a construir. Lucio Costa tratara do problema no Relatório do
seu plano-piloto: “Devemos impedir a enquistação de favelas tanto na periferia
urbana quanto na rural. Cabe a Companhia Urbanizadora prover dentro do esquema
proposto acomodações decentes e econômicas para a totalidade da população”. –
Tamanini, L. Fernando: Brasília Memória da Construção.
[2]
Tamanini, L. Fernando: Brasília Memória da Construção - Documentário, primeiro
e segundo volumes, segunda edição, Projecto Editorial, Brasília, 2003.
[3]
Memória Descritiva do Plano-Piloto de 1957.
[4]
Tamanini, L. Fernando: Brasília Memória da Construção - Documentário, primeiro
e segundo volumes, segunda edição, Projecto Editorial, Brasília, 2003.
[5]
Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos.
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